sábado, 7 de fevereiro de 2015

METAFÍSICA DA FINITUDE (Serie 70, 32°)


            O objetivo desse artigo é refletir sobre a finitude humana e a finitude do nosso mundo. Somos finitos, perecemos e experimentamos esta dura realidade ao longo da nossa vida, principalmente nestas dimensões: De seres temporais, livres, que temos dor, sofrimento e sabemos, mais que tudo, que morreremos, e o próprio mundo terá também seu fim. Nunca, talvez, na história da humanidade, esta consciência tornou-se tão preocupante como agora. Exemplo disto é a atual e angustiante preocupação com a água.
            Como seres temporais, temos consciência de que o tempo real é só o presente. O passado é experimentado como perda. Passou e dele só podemos ter saudade ou o que sobrou de ontem. Esse sentimento de perda deixa-nos angustiados sobre tudo, se foi mal vivido ou mal gerenciado por nós mesmos, ou pelas muitas dificuldades encontradas independentemente da nossa vontade. Aí, o passado, mais do que uma perda, torna-se um fardo a ser carregado no presente e no futuro.
            Se o passado é perda ou fardo, o presente é a única realidade temporal que possuímos. Mais angustiante é a terceira dimensão do tempo que é o futuro. Mas, este é incerto. Não sabemos se o teremos. Para um jovem, o futuro parece um leque de muitas possibilidades. Quando vai se avançando a idade, este leque vai se diminuindo, e inevitavelmente, leva-nos a perguntar: quanto tempo ainda tenho pela frente? Daí, a sensação da incerteza que o futuro nos provoca.
            Desde a antiguidade grega, distingue-se tempo como Cronos, ou seja, o tempo, simplesmente como tal, e Cairós, isto é, tempo, como conjunto de possibilidades, como graça, como momento de escolha, de decisão, e por isso, ele deve ser aproveitado, no sentido de saber dispô-lo, e não ser perdido, jogado fora. Com razão, diz um antigo provérbio: “A felicidade consiste em viver bem cada momento”. 
            O certo é que, a dimensão temporal provoca-nos o desejo permanente de eternidade. Não nascemos para o tempo, mas para a eternidade sem fim.
            Como seres livres, evidentemente, prezamos muito a nossa liberdade vivida como dom de Deus, e como tarefa permanente para sermos libertos de tudo aquilo que atravanca a nossa liberdade.
             Um momento muito forte da nossa liberdade, é por demais manifesto, quando temos de tomar alguma decisão, lembrando que decisão implica escolher algo, e renunciar a outras coisas. Refiro-me, claro a decisões que são fundamentais para a nossa vida, não à aquelas decisões que são epidérmicas na nossa vida, como por exemplo: ir ou não ao cinema hoje. As fundamentais são aquelas que norteiam ou nortearão nossas vidas, como por exemplo: escolha profissional, matrimonio, opção religiosa etc.
            É no momento da decisão que percebemos o risco contido na nossa liberdade. Ela é dom, sim, mas é tarefa. É tarefa muitas vezes difícil, angustiante, dolorida, mas, necessária para nossa realização humana integral, não só como pessoas e, sim, com as pessoas, com o mundo. O santo é, justamente, aquela pessoa que conseguiu integrar sua liberdade como dom e tarefa. E o mais alto nível disto é sua total disponibilidade, entrega e amor. Livre é enfim, o que sabe amar plenamente, ou seja, doar-se plenamente. C. Duquoc sublinhou que Jesus foi um “ser livre”, e, com toda a liberdade entregou-se ao Pai no seu sacrifício da cruz.
            Somos também limitados por uma tríplice realidade: a da dor, a do sofrimento e da morte.
            Toda dor limita a pessoa humana. Pode ser de maneira passageira (uma simples dor de cabeça), como de maneira permanente (como certas doenças crônicas), como certas incapacidades, cânceres etc. Há até mesmo uma antropologia da dor e do sofrimento, que nos mostra fenomenologicamente, todos os seus aspectos: pode tratar-se de uma doença passageira, como pode tratar-se de uma doença prolongada que lança a pessoa num leito; não poder decidir por sim mesmo, com liberdade; impossibilidade de andar, de ir aonde se quer; perda da sua privacidade e intimidade; ser incapaz de tomar todas as suas decisões sem interferência de familiares e de outros profissionais...
            A dor é, na maioria das vezes localizável. A pessoa diz (indicando com a mão) dói-me aqui, ali etc. Ela é localizável. Por exemplo, dor de dente (não foi à toa que Fernando Pessoa afirmou que a dor faz pensar), já o sofrimento, sem levar em conta a diversidade de sofrimentos: sofrimento físico, sofrimento moral, sofrimento psicológico, sofrimento espiritual (lembro-me de um pesquisador médico, que chorava por não conseguir acreditar em Deus!), o sofrimento social, por injustiça, por não ter seus direitos respeitados, por lhe faltar quase tudo para uma vida digna, por ser discriminado, por falta de saúde, de casa, de terra, de água etc.
            Não é um local. É a pessoa toda que sofre. Ou, populações inteiras que sofrem e se perguntam: como nos libertaremos disso?
            Há, por fim, a morte “esta megera das gentes” como dizia Pedro Nava, para muitos, a morte é um absurdo!
            Heidegger com razão constatou: “Desde que se nasce, já se é suficientemente maduro para morrer!” ou, simplesmente como diz o nosso povo: “Basta estar vivo para morrer”.
                        Este sentimento diante da morte divide opiniões. Para um ateu como era Luiz Buñuel, que, quando jovem, estudara em colégio de padres, confirmou e confessou que a morte seria um absurdo, “um caminhar para a destruição, para o nada, pois nada há depois da morte”.
            Alceu Amoroso Lima (Tristão de Athayte) bendisse o dia de sua morte, pois “partiria para a vida plena, eterna, para a ressureição”.
            Leonardo Boff retomou uma ideia dos Santos Padres, o conceito de que a “morte é o verdadeiro dia de natal” do ser humano, pois ela é partida para a vida plena, a qual fomos destinados. Ele também nos lembra que: “não nascemos para morrer, mas morremos para ressuscitarmos”.

            Nossa finitude é real, porém, aponta sempre para a Infinitude que almejamos.

Digitou este artigo: Ricardo Rodrigues de Oliveira (Enfermeiro e Cuidador do Autor).

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